segunda-feira, março 19, 2012

O mais assustador vive em nós

O medo é algo que nos acompanha desde o ventre materno,  pois sentimos o mundo exterior de um  modo único e barulhento,  através dos sentidos do outro,  do corpo que nos envolve e nos conduz.
O medo cresce com a gente. Dos monstros e fantasmas que povoam  nossos quartos,  nossos guarda roupas,  em  baixo de nossas camas,  os nossos sonhos! O medo de perdermos nossos pais,  nossa casa,  não termos comida. Quando crianças sentimos medo ao vermos os mais velhos sentirem, temos medo de ficarmos sós, de irmos pra escola no primeiro dia de aula, de desvendarmos um novo mundo. Temos medo de estranhos, na minha infância tínhamos medo do homem  do saco( que pegava as crianças e picotava),  lendas de mães criadas para protegerem  seus filhos.Não toque ali,  não mexa acolá, não vá,  não pegue,  etc... Medo de errar, de apanhar,  de ser pego numa mentira,  de não ir bem na escola... São muitos os medos que povoam a cabeça de uma criança.
Mas continuamos a crescer,  e enfrentamos novos medos,  de não sermos os mais legais,  inteligente,  admirados do meio em  que vivemos,  de sermos rechaçados, humilhados,  violentados,  agredidos,  difamados. E ainda apanhávamos por isso. Mas enfrentamos também  o medo da solidão,  do fracasso, do desamor do desafeto.
Nos deparamos com aqueles medos obscuros,  que nos mantém em  silêncio, desenvolvem  nosso senso crítico, transformam aos poucos nosso mundo... Percebemos que nossa família  não é bem aquilo que pensávamos que fosse  e passamos a buscar uma nova identidade. Este é o princípio da nossa individuação!!!
E o medo continua lá,  adotamos máscaras,  estilos, grupos... Já pararam pra pensar o quanto nossa infância reflete nesse período?
Crianças que sempre foram tratadas com respeito, conseguem  se enturmar mais rápido,  são mais seguras,  e felizes,  e tem muito menos medo,  do que aquelas que nunca foram verdadeiramente valorizadas,  encaradas como problemas por aqueles que deveriam cuidar, amar e proteger.
Adultos temem  a injustiça,  a miséria,  a doença,  fome, violência... A morte.
Eu temo quando vejo pessoas dispostas a brigarem porque são apaixonadas pelo seu time, pela sua religião, pelos seus deuses,  suas crenças,  seu estilo de vida,  e em nome disso passam por cima dos outros.
Eu temo quando vejo filhos matando pais,  pais matando filhos. Temo as injustiças que são cometidas em  nome do amor.
Certa vez falei aqui sobre abandono, descaso e conivência...
Quando menina acreditava que pai e mãe amam os filhos porque são deles, porque são pais. Mas não é verdade. Pais amam quando são capazes de amar,  e muitos não são!!! Se não se tem amor,  como cobrar amor???
Sempre ouvi que pais gostam  de todos os filhos do  mesmo jeito,  como se fossem os dedos das mãos,  nunca de quer perder algum,  hoje entendo que isso pode ser verdade,  porque  podemos usar uns dedos pra foder os outros,  ou para dar prazer a nós mesmos.  Cada um  sente como quiser, gosta como quiser,  e que injustiças sejam  cometidas com muitos em  função de um,  quem  se importa?
Hoje como a maioria das pessoas adultas, não tenho mais medo de bicho papão,  ou homem do saco,  e compartilho com elas os medos da violência,  da dor,  da solidão, mas existe um  medo,  que é só meu,  o de ter que admitir,  frente ao espelho,  que não sou amada pela minha mãe,  e isso vive em  mim,  já foi um  monstro gigante e horrendo,  hoje ele só é feio como um  espeto cravado no peito,  que dói. Faço parte do grupo de pessoas que sabem  o que é ser desrespeitado,  por aqueles que deveriam amar e proteger,  e por  mais assustador que isso pareça,  não não odeio minha mãe. Odeio o fato dela se compadecer com injustiças e compactuar livremente com mentiras,  e ainda assim professar o nome de Deus... Se voc^, leitor,  olhar para ela,  não dirá, porque não convive,  ou conviveu,  que tão doce senhora, pode ser tão mentirosa e cruel. Mas sobrevivi a infância,  graças as minhas irmãs e minha sobrinha,  fui amada,  cuidada querida e protegida,  enfrentei e enfrento hoje o mundo com cabeça erguida,  de forma honesta, não foi fácil para elas,  mas me fizeram bem,  me tornaram  mais forte e melhor... Não temo mais a solidão nem o desamor,  e luto para proteger os sobrinhos que vieram  depois de mim... o resto é um buraco negro de emoções e sentimentos,  um misto de revolta e dor... o meu monstro escondido.

segunda-feira, março 12, 2012

Meio século

Você sabe precisar o que aconteceu nos últimos 50 anos? 
No sul da Bahia, em 1962, nascia minha irmã mais velha. No mundo os Beatles estouravam, Élvis ja era um sucesso, Rolling Stones também estourava, o movimento feminista e a favor de negros e homossexuais ganham força , nascem os hippies protestando contra a Guerra fria e a Guerra do Vietnã. Fidel Castro chega ao poder e antigas colônias começam o processo de independência. O homem pisa na lua, a IBM lança o chip, e surge a primeira molécula da internet. No Brasil explode a jovem guarda com Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Wanderléia e outros. Chico Buarque, Caetano, Gilberto Gil lideram movimentos estudantis a favor da democracia. Morrem J.F.K. , Marthin Luther King Jr, e Che Guevara. A tv a cores é lançada no mundo, e a Rede Globo é criada aqui no Brasil.
E no sul da Bahia minha irmã crescia, já ganhara outros irmãos, e vivenciara a morte de um deles. Saía, ainda menina, da Bahia para São Paulo junto com sua mãe e irmãos. 
Morou com os avós paternos. Foi a escola enquanto o mundo entrava em revoluções em prol da independência, e pela tv acompanhava o escândalo do presidente Nixon com o Watergate, a crise econômica nos EUA por causa do petróleo, o aumento de armamento dos países, a violência política crescente, o fim da Guerra do Vietnã, o lançamento da Disco, a morte do Elvis. O Brasil é Tricampeão da Copa mundial. No rádio tocava Tim Maia, Elis Regina, Elton Jonh, Vinicius, Maria Bethânia entre outros.
Ia a igreja, arrumou namorado, engravidou, saiu da igreja, enfrentou o preconceito, casou, foi mãe aos 15 anos, saiu da escola, teve mais uma filha.
E a década de 80 começou sem muita felicidade ou perspectiva, mãe pela terceira vez, abandonada pelo marido, foi trabalhar como doméstica. Com três filhos e oito irmãos menores, não tinha muita escolha ou opção. 
Guerras e guerrilhas dominavam o mundo, diversos conflitos civis, golpes militares, ameaças nucleares etc. Criação dos walkmans, computadores pessoais, IBM PC, Aplle Macintosh, Windows, videocassetes, descoberta da AIDS. Morrem Jonh Lenon, Tancredo Neves, Lauro Corona, etc. Madonna e Michel Jackson estouram mundialmente.
Namorado novo, outra gravidez, princípio de eclâmpsia, o bebê não resite e morre. Volta pra casa. Emprego e arrumadeira no Sheraton Mofarrej Hotel, conclusão do colégio, curso de auxiliar de enfermagem, início de uma nova vida.
Aprovado o estatuto da criança e do Adolesdcente, o Movimento das Diretas define a abertura da democracia, campanha de eleição pra presidente, em São Paulo a primeira prefeita mulher eleita pelo povo assume a prefeitura. A queda do Muro de Berlim. No Brasil Campanha para presidente.
Em 90 sai de casa com os filhos e não volta mais, compra o seu apartamento, trabalha, namora, trabalha, namora... Sempre foi casamenteira. 
Collor é eleito, e dois anos depois renuncia, movimento dos caras pintadas, mais guerras, terrorismo. O Brasil é tetra campeão na copa. Popularização dos computadores e da internet, Windows 95, comércio eletrônico , utilização do DNA para solucionar crimes e comprovar paternidades. Michel e Madonna veem ao Brasil. Ascensão e morte dos Mamonas Assassinas. Morrem Renato Russo, Freddie Mercury e a princesa Diana.
Sai do apartamento e casa com um vizinho. Volta a morar perto da mãe. Torna-se avó pela primeira vez. Vislumbra a entrada de um novo século. O bug do milênio não acontece. A tecnologia aumenta nas redes sem fio, nos celulares, nas máquinas e computadores pessoais, de mão...
Torna-se avó pela segunda vez, casa os dois filhos mais velhos. Trabalha em dois empregos. Opera duas vezes da coluna, e nunca mais volta a ser a mesma!
Lava muita roupa, já que não pode consertar o mundo!
O Brasil se torna Pentacampeão. Avó mais uma vez, Seu filho mais novo sai de casa pra morar com a mulher.
Leva sua filha e genro para morar com ela novamente.
E assim seguem-se os dias, como na história é na vida, alguns dias são de paz, outros são de guerras, mas eles seguem, quem sabe o que será escrito no próximo meio século. 
Por hora, comemorou seus 50 anos numa festa onde chamou seus parentes, amigos e conhecidos, e tornou-se tema do meu blog. Então Cássia Silva do Carmo, á você: 


Feliz Aniversário! 

Da sua irmã caçula.




Continuaremos escrevendo, esta e outras histórias!

domingo, março 04, 2012

Mister Por Quê

Vivia questionando o porquê das coisas existirem como existiam. Não entendia o mundo,  dada sua grande complexidade. Procurou as Ciências e só se deparou com mais perguntas. Nada do que descobria era suficientemente explicativo e claro. Então desenvolveu teorias,  filosofias... Quanto mais perguntava, menos sabia de si mesmo e de suas necessidades reais.
Um  dia entrou num  barco,  desses pequenos,  e se permitiu ficar a deriva por algum  tempo... Era clara a noite  e turvos seus pensamentos. Tantas indagações estavam enlouquecendo-o. 
Porque nascemos,  vivemos e morremos já não eram  as perguntas que o moviam. Nem  mesmo entender o andar da natureza, mesmo da humanidade... 
Tantos livros fizeram  dele um  homem  culto. Viver em  sociedade lhe deram modos... Mas um porquê insistia em  incomodá-lo: Sentia-se só.
Sim,  tivera alguns relacionamentos,  pessoas bonitas ou não,  inteligentes,  sensíveis,  bacanas,  até mesmo bem  chatas,  mas nunca se sentira realmente ligado a elas. Nada o preenchia. 
Passara tanto tempo tentando descobrir verdades em  tudo, mas nunca encontrou a única verdade que nos motiva a viver,  entender conhecer o outro,  o mundo,  e principalmente sobre nós mesmos: o "AMOR". As estrelas foram se apagando,  o céu escurecendo, de repente,  água e céu tornaram-se um só na escuridão. Um  raio cortou o céu,  anunciando a tempestade que se aproximara,  e então ele entendeu,  sim,  ele já tinha se encontrado com aquela verdade,  sentiu o tremor nas pernas e frio no estomago, mas estava buscando explicações para todos aqueles por quês. Agora ele entendia. Precisava voltar atrás... Como?... Buscando tantas respostas ignorara a única que ele realmente queria?
A única vez em que se deparou,  frente a frente com ela,  usava um jeans surrado,  tênis velhos, gastos pelas caminhadas que fazia,  tinha um  jeito engraçado de falar,  de quem  estava sempre fazendo algo acontecer, e sorria de um  jeito escancarado,  de quem  não tinha  nada a temer, montando projetos,  construindo o mundo,  carregando a vida consigo,  e aquele brilho... Maria era o nome dela, como podia ter esquecido? 
O vento soprava anunciando a tempestade que viria...
Lembrou-se de que por um momento, naquele encontro,  pensara: "com você meu mundo seria perfeito",  mas existiam os maneirismos que ela não tinha,  o despudor com o qual falava das coisas e sobre tudo, sua falta de dúvidas,  como quem  nunca tivesse o que perguntar,  porque não tinha dúvidas, apenas certezas. Ele sentiu medo,  o mesmo que o fazia tremer agora, ou era o vento?
Gostaria de voltar atrás!
Porque nunca tornou a vê-la??? Olhar aqueles olhos que brilhavam  toda vez que falava dos seus objetivos... Como pôde ser tão egoísta e covarde???
A chuva caiu.  O barco naufragou ,  e enquanto ele lutava a deriva por sua vida em  meio a tempestade,  tornou a ver aqueles olhos a sorrirem  pra ele... E dias depois seu corpo foi encontrado!