Letícia acordou tarde, sentia se extremamente bem. Há tempos não dormia tão despreocupadamente. Havia sempre algo a lhe tirar o sono, o aluguel que ia vencer, a prestação do carro, contas e mais contas... Não acabavam nunca! De repente, percebeu que as contas, os problemas continuavam lá!... O que poderia ter mudado assim tão rápido? Passar de noites insones para uma tão tranquila, entregue docemente nos braços de Hipnos, e agarrada a um de seus filhos, Morfeu.
Não ficou se questionando por muito tempo! Levantou, tomou seu banho de porta aberta, porque queria banhar-se ouvindo seu CD predileto do Djavan. Cantou debaixo do chuveiro, acompanhando as canções que ouvia, sem nem lembrar que nunca mais ouvira aquele CD porque as músicas enchiam-na de tamanha saudade e tristeza, recordando Pedro... Um antigo namorado que teve tanta importância em sua vida, que ela amou tanto... E que um dia conheceu Rita, apaixonou-se e terminou com ela para se casar. Houve dias em que chegou a crer que jamais viveria sem ele!...Definitivamente, debaixo daquele chuveiro, cantando como uma criança - que por desconhecer que existam dores, desamores, solidão, canta despreocupadamente!-, suas velhas canções prediletas, sentia-se tão feliz...
Feliz!
...Esta palavra definia bem seu estado de espírito. Sentia-se tão bem e tão viva. E aquele banho, só aumentou aquela sensação. Saiu do chuveiro, vestida com seu ropão verde, atoalhado, trocou o cd, colocou um do Tim Maia, e foi dançando para cozinha tomar seu café da manhã (?). Preparou um suco, esquentou o pão de ontem, pegou uma maçãzinha e quando mordeu, deparou-se com um bichinho... Dentro da sua maçã, e lembrou-se que certa vez, fizera um drama tão grande por causa de um bichinho tão pequenininho, que olhando para maçã naquele momento, sentiu-se envergonhada. Sorriu, pegou a faca separou a parte que o bichinho comeu, e terminou de comer aquela maçã.
...Esta palavra definia bem seu estado de espírito. Sentia-se tão bem e tão viva. E aquele banho, só aumentou aquela sensação. Saiu do chuveiro, vestida com seu ropão verde, atoalhado, trocou o cd, colocou um do Tim Maia, e foi dançando para cozinha tomar seu café da manhã (?). Preparou um suco, esquentou o pão de ontem, pegou uma maçãzinha e quando mordeu, deparou-se com um bichinho... Dentro da sua maçã, e lembrou-se que certa vez, fizera um drama tão grande por causa de um bichinho tão pequenininho, que olhando para maçã naquele momento, sentiu-se envergonhada. Sorriu, pegou a faca separou a parte que o bichinho comeu, e terminou de comer aquela maçã.
Foi ao quarto vestiu um vestido, daqueles, que estão há tanto tempo no guarda roupa esperando ser usado num dia feliz e ensolarado, com uma sandalinha rasteira... Passou um leve perfume, seu protetor solar, um gloss nos lábios e saiu!
No elevador encontrou o seu vizinho do 215 com sua filha e sorriu para eles como há muito não fazia - durante algum tempo eles eram sinônimo daquilo que ela não realizou-, passou pela portaria, dizendo um bom dia tão contagiante ao porteiro, que ele estranhou. E seguiu para o mercado... Pensou em pegar o carro, mas decidiu que caminhar lhe faria bem!
Foi caminhando pelas calçadas e atravessando as ruas com o ar mais jovial e alegre que podia exibir, que nem se dava conta de que aquele seu brilho contagiava as pessoas que olhavam para ela. "Ali vai uma 'menina' feliz", pensavam. Entrou no mercado, pegou a cesta de compras, não tinha dinheiro para comprar o que coubesse num carrinho, nem necessidade de tanto, mas era a primeira vez, que não pensou nisso!
Passeava por entre as prateleiras para escolher o que levaria e decidiu pegar um iogurte de litro, um pacote de bolacha, outro de torrada, pão de forma e frios. Quando ia em direção ao caixa, lembrou-se que não pegou o suco de maracujá, nem o absorvente, e voltou para busca-los. Retornando ao caixa, esbarrou num homem que parou subitamente à sua frente, para pegar algo na gôndola, era tão desligada as vezes! Levantou os olhos para se desculpar e deu de cara com Pedro... Macarrão instantâneo na mão, mais velho com ar de cansaço... Triste! E ela que não se dera conta do quanto ele deixou de ser importante em sua vida, naquele momento sorriu o seu sorriso mais doce e bonito, desculpou-se e comprimentou-o com tanta naturalidade, que ele se espantou.
- Como está? perguntou ela.
- Bem, ele respondeu. - Não tanto quanto você, mas bem, á medida do possível... E sorriu, aquele sorriso sem graça...
Ela ia se despedindo, ele perguntou se queria uma carona, ele já estava indo, poderia levá-la, ela disse que não, mas devido a insistência, aceitou. Passaram pelo caixa, cada um com sua compra, entraram no carro , ele foi falando do tempo que não se viam, de como ela estava bem, bonita, mais leve, como mudou e aproveitou para convidá-la para tomar um café em nome dos velhos tempos... Ela aceitou.
Sentaram numa lojinha do FraN's Café, ela pediu um milk shake de café, ele uma shweppes, e iniciou-se o seguinte diálogo:
Ele: - É muito bom te ver novamente, foi uma surpresa te encontrar naquele mercado, voltei há poucos dias para o meu antigo endereço... Você continua desligada... O que tem feito?... Faz quanto tempo... três... quatro anos?
Ela: - Na verdade, faz 5 anos, pôxa, realmente faz tempo!... O que eu tenho feito?... Vivido! Trabalhei, estudei, troquei de emprego, mudei de casa para um apartamento, conheci pessoas...
- Casou?...Teve filhos?
- Não, passei muito tempo sentindo dor, outras vezes sentindo nada, parti alguns corações... mas o meu estava partido!... Houve dias em que senti tanta dor, que quase não conseguia respirar, mas eu continuei respirando, não sabia fazer outra coisa.
- Eu casei naquele rompante, tive dois anos felizes, virei pai, tive um filho, tinha um cachorro, e acreditei que minha vida era perfeita... Mas não foi e não era assim! - o desânimo se apoderou do rosto dele.
- O que houve?
- Pensei em te ligar diversas vezes... Não sabia se devia, então desisti. Algumas vezes fui à porta da sua casa, tentando simular um encontro casual... mas nunca tive coragem de descer e tocar a campainha... A minha vida tem sido difícil... Você não sabe o quanto foi bom te encontrar!... Suspiro profundo.
- Olha Pedro, eu não sei o que se passou ou tem se passado com você... Eu sei que hoje, pela primeira vez, nesses cinco anos eu nunca me senti tão feliz...
- Algum motivo especial?
- Não exatamente!... Uma noite de sonho bom, bem dormida, uma sensação boa de calma, felicidade... Paz, não sei!... Um dia azul...
- Acho que nosso encontro estava escrito...
- Não... Penso que não... Eu juro que não entendi porque depois de tanto tempo, me senti assim... Como te disse, houve dias muito ruins, pensando bem, agora, anos... A sua ausência me sufocava, saí daquela casa porque não suportava lembrar de nós dois, mas as lembranças e a dor entraram no meu apartamento antes mesmo que eu colocasse os móveis... Então me tranquei, não, não que eu não saísse, mas sentia um vazio e uma solidão tão grande, arrumei namorados, cheguei até a noivar... Mas não pude seguir com a farsa... Aí o tempo foi passando, mergulhei em outros problemas, trabalho, dinheiro... E então aconteceu o hoje!... Minha alegria, o cd do Djavan, o bom e velho Tim Maia cantando aquela: " vou pedir pra você voltar, vou pedir pra você ficar..." E como minha noite de sono, foi perfeito! Sem dor, sem ausência de sentimentos, só feliz.... O vestido, a sandália rasteirinha, o vizinho com o filho no elevador, o porteiro, a caminhada até o mercado... e você!!!
- Eu me separei, não deu certo... Mas hoje olhando pra você, assim... Pensei, será que podiamos...
- Nem termina esta frase, eu quis tanto que você voltasse, eu sonhei tanto com o dia em que você viria, mas não foi assim, você não veio. Não voltou... E foram tantas noites sonhando acordada... Talvez, se fosse ontem... ontem ainda existia um vazio, mas hoje?!... Hoje que eu não pensei em não pensar em você, e nem tive consciência disso... Ah, mas ontem... esses seus olhos tristonhos poderiam me arrastar para o seu mundo, para fora de mim mesma... Ontem eu ia cuidar das suas feridas, nem ia pensar no hoje, se você ficaria, ou não... Mas hoje, eu estou tão bem comigo... E isso não acontecia há tanto tempo... Que hoje, hoje não!
- Você podia pensar, nós podiamos sair outras vezes...
Letícia terminou seu milk shake, olhou nos olhos de Pedro, desejou a ele dias melhores, pediu que ele pegasse sua sacola no carro, ao que ele reagiu dizendo que a levaria até em casa, mas dessa vez ela realmente declinou. Disse pra ele que a tarde estava linda, ela precisava caminhar um pouco... Foram até o carro, ela pegou suas sacolas, e despediu-se dizendo que ela nunca soube como seria encontrá-lo novamente até aquele dia, mas que tinha sido muito melhor do que todos os sonhos que ela teve um dia, pois foi num dia em que ela descobriu-se essencial, para ela mesma, e que lamentava as coisas terem dado errado pra ele, ela nunca desejou que fosse assim, mas que o mundo dava voltas, e aquilo que ele estava sentindo ia passar... Abraçou Pedro, deu um beijo no rosto dele, e partiu sem olhar para trás.
Ela nunca soube, mas naquele dia Pedro chorou, achou sua vida totalmente sem sentido, pegou o carro dirigiu na contra mão, e bateu.
Era fim de tarde, o sol lhe sorria no horizonte...Ela era uma mulher que voltava do supermercado, caminhando com suas duas sacolinhas, rasteirinha nos pés e vestido... Ela era Feliz!
No elevador encontrou o seu vizinho do 215 com sua filha e sorriu para eles como há muito não fazia - durante algum tempo eles eram sinônimo daquilo que ela não realizou-, passou pela portaria, dizendo um bom dia tão contagiante ao porteiro, que ele estranhou. E seguiu para o mercado... Pensou em pegar o carro, mas decidiu que caminhar lhe faria bem!
Foi caminhando pelas calçadas e atravessando as ruas com o ar mais jovial e alegre que podia exibir, que nem se dava conta de que aquele seu brilho contagiava as pessoas que olhavam para ela. "Ali vai uma 'menina' feliz", pensavam. Entrou no mercado, pegou a cesta de compras, não tinha dinheiro para comprar o que coubesse num carrinho, nem necessidade de tanto, mas era a primeira vez, que não pensou nisso!
Passeava por entre as prateleiras para escolher o que levaria e decidiu pegar um iogurte de litro, um pacote de bolacha, outro de torrada, pão de forma e frios. Quando ia em direção ao caixa, lembrou-se que não pegou o suco de maracujá, nem o absorvente, e voltou para busca-los. Retornando ao caixa, esbarrou num homem que parou subitamente à sua frente, para pegar algo na gôndola, era tão desligada as vezes! Levantou os olhos para se desculpar e deu de cara com Pedro... Macarrão instantâneo na mão, mais velho com ar de cansaço... Triste! E ela que não se dera conta do quanto ele deixou de ser importante em sua vida, naquele momento sorriu o seu sorriso mais doce e bonito, desculpou-se e comprimentou-o com tanta naturalidade, que ele se espantou.
- Como está? perguntou ela.
- Bem, ele respondeu. - Não tanto quanto você, mas bem, á medida do possível... E sorriu, aquele sorriso sem graça...
Ela ia se despedindo, ele perguntou se queria uma carona, ele já estava indo, poderia levá-la, ela disse que não, mas devido a insistência, aceitou. Passaram pelo caixa, cada um com sua compra, entraram no carro , ele foi falando do tempo que não se viam, de como ela estava bem, bonita, mais leve, como mudou e aproveitou para convidá-la para tomar um café em nome dos velhos tempos... Ela aceitou.
Sentaram numa lojinha do FraN's Café, ela pediu um milk shake de café, ele uma shweppes, e iniciou-se o seguinte diálogo:
Ele: - É muito bom te ver novamente, foi uma surpresa te encontrar naquele mercado, voltei há poucos dias para o meu antigo endereço... Você continua desligada... O que tem feito?... Faz quanto tempo... três... quatro anos?
Ela: - Na verdade, faz 5 anos, pôxa, realmente faz tempo!... O que eu tenho feito?... Vivido! Trabalhei, estudei, troquei de emprego, mudei de casa para um apartamento, conheci pessoas...
- Casou?...Teve filhos?
- Não, passei muito tempo sentindo dor, outras vezes sentindo nada, parti alguns corações... mas o meu estava partido!... Houve dias em que senti tanta dor, que quase não conseguia respirar, mas eu continuei respirando, não sabia fazer outra coisa.
- Eu casei naquele rompante, tive dois anos felizes, virei pai, tive um filho, tinha um cachorro, e acreditei que minha vida era perfeita... Mas não foi e não era assim! - o desânimo se apoderou do rosto dele.
- O que houve?
- Pensei em te ligar diversas vezes... Não sabia se devia, então desisti. Algumas vezes fui à porta da sua casa, tentando simular um encontro casual... mas nunca tive coragem de descer e tocar a campainha... A minha vida tem sido difícil... Você não sabe o quanto foi bom te encontrar!... Suspiro profundo.
- Olha Pedro, eu não sei o que se passou ou tem se passado com você... Eu sei que hoje, pela primeira vez, nesses cinco anos eu nunca me senti tão feliz...
- Algum motivo especial?
- Não exatamente!... Uma noite de sonho bom, bem dormida, uma sensação boa de calma, felicidade... Paz, não sei!... Um dia azul...
- Acho que nosso encontro estava escrito...
- Não... Penso que não... Eu juro que não entendi porque depois de tanto tempo, me senti assim... Como te disse, houve dias muito ruins, pensando bem, agora, anos... A sua ausência me sufocava, saí daquela casa porque não suportava lembrar de nós dois, mas as lembranças e a dor entraram no meu apartamento antes mesmo que eu colocasse os móveis... Então me tranquei, não, não que eu não saísse, mas sentia um vazio e uma solidão tão grande, arrumei namorados, cheguei até a noivar... Mas não pude seguir com a farsa... Aí o tempo foi passando, mergulhei em outros problemas, trabalho, dinheiro... E então aconteceu o hoje!... Minha alegria, o cd do Djavan, o bom e velho Tim Maia cantando aquela: " vou pedir pra você voltar, vou pedir pra você ficar..." E como minha noite de sono, foi perfeito! Sem dor, sem ausência de sentimentos, só feliz.... O vestido, a sandália rasteirinha, o vizinho com o filho no elevador, o porteiro, a caminhada até o mercado... e você!!!
- Eu me separei, não deu certo... Mas hoje olhando pra você, assim... Pensei, será que podiamos...
- Nem termina esta frase, eu quis tanto que você voltasse, eu sonhei tanto com o dia em que você viria, mas não foi assim, você não veio. Não voltou... E foram tantas noites sonhando acordada... Talvez, se fosse ontem... ontem ainda existia um vazio, mas hoje?!... Hoje que eu não pensei em não pensar em você, e nem tive consciência disso... Ah, mas ontem... esses seus olhos tristonhos poderiam me arrastar para o seu mundo, para fora de mim mesma... Ontem eu ia cuidar das suas feridas, nem ia pensar no hoje, se você ficaria, ou não... Mas hoje, eu estou tão bem comigo... E isso não acontecia há tanto tempo... Que hoje, hoje não!
- Você podia pensar, nós podiamos sair outras vezes...
Letícia terminou seu milk shake, olhou nos olhos de Pedro, desejou a ele dias melhores, pediu que ele pegasse sua sacola no carro, ao que ele reagiu dizendo que a levaria até em casa, mas dessa vez ela realmente declinou. Disse pra ele que a tarde estava linda, ela precisava caminhar um pouco... Foram até o carro, ela pegou suas sacolas, e despediu-se dizendo que ela nunca soube como seria encontrá-lo novamente até aquele dia, mas que tinha sido muito melhor do que todos os sonhos que ela teve um dia, pois foi num dia em que ela descobriu-se essencial, para ela mesma, e que lamentava as coisas terem dado errado pra ele, ela nunca desejou que fosse assim, mas que o mundo dava voltas, e aquilo que ele estava sentindo ia passar... Abraçou Pedro, deu um beijo no rosto dele, e partiu sem olhar para trás.
Ela nunca soube, mas naquele dia Pedro chorou, achou sua vida totalmente sem sentido, pegou o carro dirigiu na contra mão, e bateu.
Era fim de tarde, o sol lhe sorria no horizonte...Ela era uma mulher que voltava do supermercado, caminhando com suas duas sacolinhas, rasteirinha nos pés e vestido... Ela era Feliz!
uau! Nada como encontrar a paz que vem de dentro e irradia o mundo à volta. Seu texto me fez me reerguer numa noite que estava quase esmaecendo. Obrigada!
ResponderExcluir"Suas palavras me animam, e coincidentemente, muitas vezes são os seus textos que me tocam assim!!!"
ResponderExcluirOuça a música ao seu redor, só não esqueça que a magia está em você!!!